sábado, 22 de novembro de 2008

Carnaval

Já desperto o sonho de mortos vivos,
Acabrunhados pelo sono em apoteoses,
Fantoches e confetes dão vau à carne.
A felicidade bate à porta
E sem demora, avisa que veio pra ficar.

Edilberto vilanova

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Identidade

Em mim não há idade, nem festa
Em mim não há história, nem fósseis
Em mim não há rótulo, nem sexo
O que está em mim se q u e b r a.

Edilberto Vilanova

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Haikai sem vida

A vergar espinhos
Desabrocho-me em flor,
_Morro sem odor.

Edilberto Vilanova

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

O tempo e a matéria

Um poeta sem matéria
Desfolha a alma,
Flerta o lado torto do verso e espera:
Palavras e resíduos de festas.
Desmaterializado, o verso se industrializa.
Dissimulado, simula o espetáculo,
Encrespa-se, encrava-se e se infesta.
Infestado, imerge e se entristece
E assim, com olhos caleidoscópicos,
O poema, oráculo, copia os séculos
O espetáculo se entardece
E o poeta, binóculo desorbitado,
Decai com a cadência das décadas
E a matéria, já decomposta vira feto,
Enfim, o tempo e o fim.
Descompassado, o poema se emudece.

Edilberto Vilanova

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Submarino

Na hora do mergulho, submerso o submarino subverteu-se
E agora, eis me a desfazer o sonho em taça,
Eis me a seguir relâmpagos na desventura dos cálices,
A entornar vácuos e acordar fantasmas
Eis me aqui dragão nebuloso, risonho e asqueroso
Quando o coração já é fumaça
E o peito se derrama outra vez
E o silêncio grita outra vez
Pois já rodopiaram os instantes e se quebraram os limites.
Quando tudo se cala,
Explodem raros castiçais de nuvens desvirginadas
Em espirais convulsas de hálitos mofados.
Mas a boca ainda se abre e de sobressalto, em retalhos,
Resta à fala e diante dos olhos há tantas coisas!
Tantas palavras que antes eram náufragos
E agora são naus, que embora desatinadas, carregam um grande fardo
E ainda conseguem fugir do sopro da tempestade.

Edilberto Vilanova

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

A morte de Cupido

Vingai-vos por amor, adornai
Minhas mãos com fogo
Na regência das palavras, apartai
Parte a parte o todo

Ao amor, esse gracejo, adorai
Partido. Apartei-me do jogo,
Por vê-se ferido, cai,
Vencido, perdi o fôlego.

Com tanto amor esculpido,
Ainda rola o pranto,
Não se ouviu o grito de cupido

E ele, deus desvalido,
Desafinou-se, afagou o canto
Quedou-se e feneceu desconstruído

Edilberto Vilanova

sábado, 27 de setembro de 2008

Outras partes

Não chores como eu
Invente uma arte
Não fique falho como eu
Pois existe outro
Que se encontra em qualquer parte
E quem está aqui
Não sou eu nem o outro
É apenas a parte louca
Que contesta a novela volúvel
Que insiste no mesmo capítulo
Quando brota um novo jornal
Porém, com o mesmo noticiário.
Variável dor
Que não sabe se dói ou se desfaz o amor.
Amor?
Será o amor condenado, calculado, sacrificado,
Servido à mesa num prato raso?
Mas, não chores como eu
Invente uma arte
Pois quem está aqui
Não sou eu nem a parte louca,
Agora é o outro
Que vem de outras partes
E se reparte em arte.


Edilberto Vilanova

terça-feira, 9 de setembro de 2008

Sadopoema

A poesia não bate à porta
Salta sobre a janela
Contamina a casa

Todo poeta é uma virgem
À espera da poesia
Ela chega num cavalo branco
E toma o poeta pra si
Deflora o poeta

A poesia é sádica
Cospe um não na cara do poeta
E se nega
Enquanto se insinua
De mordaça e chicote
Exulta ante a suplica do poeta

A poesia é o pesadelo do poeta
Companheira da musa de olhos arregalados: insônia
Mas quando vem e se dá
É gozo de alma e carne
É delírio onírico do poeta disperso.


Vivaldo Simão

Adeus amigo triste (Somos um povo doente)*

Luiz não quis ficar. Partiu. Tomou mais cedo o trem arcano e inevitável a qualquer um de nós. Luiz partiu, e porque?. Deixou filhos e ausência de explicações. Talvez porque soubesse que partir é tão inexplicável quanto ficar. Disse não ao sol de uma segunda-feira quente e virou estatística. Eu vi seu corpo estático e pensei num paradoxo: Em silencio absoluto Luiz gritava: “nós somos um povo triste!”.
Debaixo dessa casca festeira somos doentes de uma melancolia enrustida. Os homens são bichos estranhos e tristes mas eu falo especificamente do homem oeirense. A sina suicida dessa cidade me abisma desde muito cedo.
Luiz foi encontrado com uma corda no pescoço. Aqui se nasce com uma simbólica corda no pescoço. Ela afrouxa-se e aperta-se, regulada por um estranho mecanismo invisível que se veste de sorrisos e solta fogos de artifícios. Com o barulho do lado de fora a fera se esconde por dentro e devora sem se fazer notar. A fera se veste de fé, que é o contentamento de quem já não tem qualquer outro sentido pra viver além da esperança de recompensas, da espera de novos Jardins do Edens.
Engraçado com a gente espera tão pouco da vida que a gente tem! Já reparou que a maioria de nós vive em função da vida que a gente espera pra depois da vida?
A fera se veste de paixões porque a paixão é a substancia do homem.
Existe aquele velho clichê que diz que ”a vida é um circo”. E nós, o que somos? Não sei. Mas sei bem o que não aprendemos a ser: nós não aprendemos a ser domadores> Não aprendemos que o ofício de domar a fera pode até ser perigoso mas é imprescindível pra que transcorra bem esse espetáculo chamado vida.
“Por que a gente é assim? Canibais de nós mesmos, antes que a terra nos coma”

*escrevi esse texto a um tempão e perdi-o entre papeis. Só hoje pude reencontra-lo e publico agora minha homenagem ao meu amigo Lú, que me ensinou acordes e sonhos.E ao povo triste desse lugar estranho que tem sido meu ninho a 20 anos.

Vivaldo Simão

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Asa delta

Subiu a serra

Para esconder o fado

De longe se via seu desalinhar,

Comprimiu gotas de esquecimento

Rompeu com os astros invisíveis da sua mente

Robusto e novamente cego comprou asas, virou deltas,

Disperso, decaiu-se sobre o arco, abriu asas e voou.

Mais valia o último vôo do que o navegar

De náuseas e dias compartidos.

Então encontrou o fado

E desceu a serra.

Edilberto vilanova

segunda-feira, 21 de julho de 2008

Elos

Sons em tons de rosa
Ressaca de novas ondas
Lá fora a chuva corre calma
Enquanto em me retraio
E me expando até onde jaz qualquer possivel limite
Não há mesuras nessa total falta de espaço
Nem relogios que abriguem esse tempo
No delicado espaço entre o que sou e o que sinto
Nenhum sentido
Todo o sentido do mundo
E todos os sentidos são
Holofontes inversos
Acenam o porto de fora pra dentro

Por um minuto indefinido
Eu, fossil de um homem perdido na história
Adormeci
E acordei nos braços de um tempo
Em que os limites eram lanços rotos
Na ânsia da quebra
Um parto entre homens que eu era
E homens que de mim virão.

Vivaldo Simão

Despertador

Ao despertar da dor
A exatidão do tempo rompe o silêncio
Em rascunhos e fagulhas.
De novo o alvorecer, sonho retirante a abrir feridas
O corpo se desfibra e arde novamente
O sol, condenado a nascer, recorta as vísceras
E espalha pelos escombros de qualquer mercado
Flores e lástimas cobertas de vítimas.
Não mais vozes do silencio
Agora mapas do acaso
Não mais amores vãos
Agora resquícios de orgasmos
nada mais escuro
Agora louvores
Cores e atores
Abram as cortinas para o teatro corrosívo do dia
Pois repleto de dramas
Recomeça mais um grande ato amargo e mágico de viveres.

Edilberto Villanova

sexta-feira, 27 de junho de 2008

Efeito estufa

Vorazes e alheias ao corpo
Balas de metal cortam a avenida
Criam um mar sobre nossas cabeças
E um túmulo sobre nossos pés

No asfanto, pequenas flores murchas
Termicamente invertidas, agonizam
Sobrevivem aos tragos
de minerais e gáses enfurecidos

É o desatino exato da prole do inseto
Que formula seu próprio inceticida

Acedam incensos para a morte
Que na metrópole ninguém chora
Ou será que ninguém ama?


Estamos no fim dos tempos
É a evasão total do amor
Uma vez provincia sempre provincia

A louca da esquina queria saber
Porque o jornaleiro se matou
Será que nos jornais não há mais palavras de amor?

Acedam incensos para morte
que na metrópole ninguém chora
Tumulto! Abalou a avenida central
O que foi? Foi suicídio
Ele se envenenou com fumaça
E morreu asfixiado

Automóveis movem à morte
Há arvores mortas na calçada
Há canções mortas seguindo o cortejo
Há jornais sobre o corpo do jornaleiro

Edilberto Vilanova


quarta-feira, 11 de junho de 2008

Carrocéu

Da aurora ao luar corre em círculos
Cavalos e moinhos endoidecidos
Sobre meninos e lobos: homens adulterados
E corações dissolvidos em óleo diesel

Da aurora ao luar o cavalgar ondulado
E a corrida ressequida dos dias
Inscrições de cimento e vida
Que correm pro céu corre(céu) de carrossel

E de tanto elo, de tanta corrente, de tanto correr
Se despedaçam os risos
E a tez enegrecida da lua
Traz o replicar dos sinos e tudo se divide:

Estampidos e gritos viram detritos de silencio
E de tanto abraço os braços se enlaçam
De tanta palavra a boca se cala
De tanto cavalgar as patas se partem
De tanto dar-se as mãos os dedos se abrem

E de resto sobra esse hesitar
Ah! Esse hesitar de amigos em conflito
Esse hesitar de amores retrô(cidos)
E dos grilos recolhendo magoas no telhado

Ah! Esse hesitar de tantos idos
De lagrimas, labirintos e hinos
Esse hesitar a adulterar o itinerário dos meninos
Epitáfio feito ao rebentar da vida
De mármore e morte

De resto sobra esse hesitar
Trancafiado em viés, trocando anéis
E correndo sempre para o mesmo lugar
Correndo pro céu corre(céu) de carrosséis

Edilberto Villanova

terça-feira, 10 de junho de 2008

O QUE FAZ BEM PRA SAÚDE?


Cada semana, uma novidade. A última foi que pizza previne câncer do esôfago.
Acho a maior graça. Tomate previne isso, cebola previne aquilo, chocolate faz bem, chocolate faz mal, um cálice diário de vinho não tem problema, qualquer gole de álcool é nocivo, tome água em abundância, mas peraí, não exagere...
Diante desta profusão de descobertas, acho mais seguro não mudar de hábitos.
Sei direitinho o que faz bem e o que faz mal pra minha saúde.
Prazer faz muito bem.
Dormir me deixa 0 km.
Ler um bom livro faz eu me sentir novo em folha.
Viajar me deixa tenso antes de embarcar, mas depois eu rejuvenesço uns cinco anos.
Viagens aéreas não me incham as pernas, me incham o cérebro, volto cheio de idéias.
Brigar me provoca arritmia cardíaca.
Ver pessoas tendo acessos de estupidez me embrulha o estômago.
Testemunhar gente jogando lata de cerveja pela janela do carro me faz perder toda a fé no ser humano.
E telejornais os médicos deveriam proibir - como doem!
Essa história de que sexo faz bem pra pele acho que é conversa, mas mal tenho certeza de que não faz, então, pode-se abusar.
Caminhar faz bem, dançar faz bem, ficar em silêncio quando uma discussão está pegando fogo faz muito bem: você exercita o autocontrole e ainda acorda no outro dia sem se sentir arrependido de nada.
Acordar de manhã arrependido do que disse ou do que fez ontem à noite é prejudicial à saúde.
E passar o resto do dia sem coragem para pedir desculpas, pior ainda.
Não pedir perdão pelas nossas mancadas dá câncer, não há tomate ou muzzarela que previna.
Ir ao cinema, conseguir um lugar central nas fileiras do fundo, não ter ninguém atrapalhando sua visão, nenhum celular tocando e o filme ser espetacular, uau! Cinema é melhor pra saúde do que pipoca.
Conversa é melhor do que piada.
Beijar é melhor do que fumar.
Exercício é melhor do que cirurgia.
Humor é melhor do que rancor.
Amigos são melhores do que gente influente.
Economia é melhor do que dívida.
Pergunta é melhor do que dúvida.
Tomo pouca água, bebo mais que um cálice de vinho por dia, faz dois meses que não piso na academia, mas tenho dormido bem, trabalhado bastante, encontrado meus amigos, ido ao cinema e confiado que tudo isso pode me levar a uma idade avançada.
Sonhar é melhor do que nada.



Luís Fernando Verissimo




Postado por Hérika Prazeres

sábado, 7 de junho de 2008

Hoje é o futuro

O futuro é hoje.
Hoje é o futuro.
Então por que esperar?
O amanhã é um terreno incerto e escuro
Não se sabe o que tem por vir.
O presente virará passado.
E nós poderemos ser estória.
Relatos de livros e jornais.
Ou simplesmente mais um que nasceu e morreu sem dizer adeus.
Você já tem o passaporte.
Somos passageiro do tempo.
Com hora marcada de partir.
Louva o que tem para louvar;
Canta o que tem para cantar;
Chora o que tem para chorar;
Abraça o que tem para abraçar;
Ama o que tem para amar.
Não deixe o tempo passar.
E se poder escolher!
Não deixe que a sua preferência seja sua derrota no futuro.
Pois saiba que depende de você.


Eder Pereira

quinta-feira, 5 de junho de 2008

Horas Verdes

Agora meu peito é um rádio:
Pulsa ondas de baixa freqüência
Fragmentada(mente) lateja minha consciência
As palavras se interrompem em paredes imaginarias
Errantes, resvalam entre valas, declives
E tudo que há pela sala
São fantasmas invisíveis

Entre zonas de eras eternas
Eu tenho a cor da água
Eu corro em câmera lenta
Desencarnado, suponho um purgatório
Reconheço o infinito no espaço físico
Esvaeço no abstrato desse rio químico
Cuja fonte emana menta
N’algum canto em minha mente

Agora ao som da música em câmera lenta
Cada cena do cinema surreal
Em teatro, em som, em sombra, em cor
Em alma, como um Almodovar
Termina e recomeça sem um elo exato
Tenho asas no sapatos
Tenho um fardo na cabeça
E aos olhos da menina que me miram, luas cheias, posso ser um Deus
Ou posso ser o avesso
Recolhendo culpas num saco de lixo

Vivaldo Simão

quarta-feira, 4 de junho de 2008

O pernilongo (conto)

Era o melhor dos mundos. Mata Atlântica e praia, num mesmo local, num mesmo momento. Uma varanda, uma churrasqueira (nunca usada, mas lá), uma rede.

Doces loiras a caminho do mar, The Beatles alto, a culpa baixa. E a pressa, nenhuma. Vinho.

Mas tinha pernilongo.

A primeira providência foi chamar o Flávio Scherer, cobra em telas para janelas. Fiz uma no meu escritório e outra entre a varanda e a sala. No quarto já tinha. Fechando a porta da cozinha eu estava salvo dele, o pernilongo.

Mas na primeira noite, já me sentindo isolado do zumbidinho e das picadonas, ele apareceu nos ares, ele estava lá. E pernilongo é maldoso. Não basta picar. Primeiro ele fica te azucrinando o ouvido. E você, feito um idiota, dando tapas na própria orelha. Não há nenhum registro no mundo de alguém que tenha matado um pernilongo assim.

No dia seguinte comprei aqueles tabletinhos verdes que coloca na tomada. E deixei, antes de ir dormir, o quarto todo borrifado com um spray que dizia que matava tudo. Fui deitar com um cheiro ruim no quarto. Mas quem é que aparece lá de madrugada? Como se a coisa não fosse com ele.

Levanto, acendo a luz. Vejo onde ele está, pego a toalha todo sonolento e vou à luta. Mas ele sempre ganha. Mesmo quando você acerta uma toalhada nele, ele dá uma de que vai a nocaute, mas faz uma curva no ar e vai lá para cima. A noite está perdida.

Chamo o Flávio de novo. Quero telas protetoras na cozinha, no outro quarto, na área de serviço, no quarto de empregada e no banheiro idem. Em uma semana a casa estava completamente protegida. E, quando eu entrava da rua era rápido e abria a porta o menos possível. Eu estava protegido. Ele não teria por onde entrar.

Duas da manhã, ele. Direto na minha orelha, me gozando, pensei. Mas por onde teria entrado? Não havia nenhuma possibilidade. Foi quando eu pensei que talvez ele já estivesse lá dentro quando o Flávio colocou todas as telas e ele estaria me avisando que queria sair. Mas era um só e eu resolvi ir à luta. Na mão esquerda um superjato e na direita a toalha. Fechei todas as portas do quarto. Era eu e ele. Um dos dois ia morrer. Não chegou a ser a Guerra dos 100 Anos, mas ele desaparecia como o Bin Laden, que era como eu o chamava: aparece, Bin, se você for macho! Já estava clareando quando eu acertei uma bordoada fatal nele. Sujou a parede de sangue. Sangue meu, naturalmente.

Na noite seguinte, outro. Resolvi olhar todas as telas, ver se havia uma frestinha. Nada, o Flávio é cobra. Quando entrei no banheiro, tinha dois lá dentro. Pensei: o ninho é aqui. E descobri. Eles entravam pela ventilação no teto. O Flávio colocou uma tela lá. Aproveitou e colocou outra debaixo do ralo.

Antes de ir dormir, chequei a casa toda. Não havia a menor possibilidade.

Até os ralos de todas as pias e banheiras, tapados. Hoje eu ia dormir em paz.

Dormi. Até que ele voltou. Acendi a luz e fiquei olhando para ele. Era o Bin Laden, eu havia matado o afegão, perdão, o pernilongo errado. Como que eu sabia que era o Bin? Minha senhora, eu estava havia dias convivendo com ele, conhecia seu jeitão, seu estilo de voar, e principalmente, sua voz.

Ele ficava zanzando na minha frente, parecendo que pedia uma trégua, um acordo. Fiz o tal de acordo. Me cubro todo e deixo o pé de fora. Você só pica o pé, tudo bem? Ele balançou a cabeça. E mais, pica uma vez só por noite. Tudo bem? E mais uma coisa e a mais importante de todas. Calado! Nada de zumbido no meu ouvido, pelo amor de Deus!

E assim foi. Meu pé direito começou a ficar inchado. E o Bin, gordo, imenso, tendo dificuldade até para vôos mais rasantes. Comecei a me afeiçoar a ele.

E tive a grande idéia. Toda noite, antes de dormir, fazia um micro furinho no dedo, saia um sanguinho, deixava num pires para ele. Na manhã seguinte o pires está limpinho. Impressionante.

Antes de ontem ele amanheceu morto, ao lado do pires. Deve ter morrido de velho. Ou de dengue.

Agora dormia tranqüilo, no silêncio das ondas do mar. Mas acordava sobressaltado toda hora: cadê o Bin? Cadê o Bin? E penso, de vez em quando:

será que ele morreu mesmo? Será que ele não vai aparecer a qualquer momento?

Não sei, mas continuo dormindo com o pé fora das cobertas. Quem sabe, né?




Mário Prata
escritor



Postado por Hérika Prazeres

sábado, 31 de maio de 2008

Cantada


Você é mais bonita que uma bola prateada de papel de cigarro

Você é mais bonita que uma poça dágua límpida num lugar escondido

Você é mais bonita que uma zebra

que um filhote de onça

que um Boeing 707 em pleno ar

Você é mais bonita que um jardim florido em frente ao mar em Ipanema

Você é mais bonita que uma refinaria da Petrobras de noite

mais bonita que Ursula Andress

que o palácio da Alvorada

mais bonita que a alvorada

que o mar azul-safira da República Dominicana

Olha,Você é tão bela quanto o Rio de Janeiro em maio

e quase tão bonita quanto a Revolução Cubana.






Ferreira Gullar

Escritor Maranhense




Postado por Hérika

segunda-feira, 26 de maio de 2008

Poema àcido

Morda vossa laranja amarga
Pinte vossos olhos com cebola e limão
Guarde vossos chinelos, vosso segredos
E vossos brinquedos

O crepusculo e seus raios de fogo afungentaram o teu rebeto
e o teu regaço
E tú ficastes deserta, dispersa,
manchada de cinza e sangue
E quando o (ultra)sol(violeta)violentou teus olhos
Passastes a ouvir o grito preso na garganta
Passastes a sentir o ácido da lingua de quem te protegia
Ao ver que o livro de receitas lido pelo avesso discrepou tua rosa
Que a muito tempo já estava morta.
Agora Dê-me uma maçã
Um abacaxi, uma laranja amarga
Uma roupa rasgada, um perfume barato
Um coração de lata e um chocolate
E quando beberes o vinho lembre
Do cheiro e do sangue que ainda habita nossas roupas
Esqueça as lagrimas que desceram inuteis pelo esgoto
E veja que o que ardeu em nosso corpos
Hoje é neve, é nave
É um passaro, a fumaça
E as nuvens, é um rio, um mar e um poço.

Edilberto Vilanova

Poema àcido

quarta-feira, 21 de maio de 2008

A canção do espirito

A canção do espirito
Adormece o corpo como febre
Faz valsa o batimento cardiaco
Entorpece a vida
E derrama gotas de delirio pela terra

Ah!Como soam bem esses novos acordes
Acorde!Repare nas cores transversais
Que desabam do seu
E se envenene com mel
Porque ainda há abelhas fecundando flores
E a pedra sempre pó
Traz de pouco a pouco a flor do sono
A eternidade é deserta e o corpo desbota
E como cai bem no desalinhar do corpo
Essas novas roupas

Ah!Como são sinceros nossos garotos
Como são modernas nossas moças
Amanhã ou depois virão outros
E tudo será memória
Em outros corpos os mesmo fantasmas
E a canção do espirito tocará
E vai haver dor e lagrima, mas
No fim, em casas subterraneas
Ficaram tons neutros e residuos de vozes
E será só cnção para todas as almas atrozes

Edilberto Vilanova

Chuva

Findou se o retirar dos retirantes
No vento a cantilena retumbante
Clarão no céu da patria neste instante
E lá na negra nuvem-nave adiante
Regalo raro para um povo errante

E brota o riso frouxo, a reza grata
O verso a anunciar contentamento
E baila a folha verde ao som do vento
E a dança do inverno adentra a mata

A nuvem conta-gotas pinga água
E paulatinamente a chuva desce
E a poça progressivamente cresce
Um sapo sorrateiro à poça salta
E solta um som aberto peito afora
E o velho diz que a chuva é o céu que chora

Agora,
O fim do estio afinal
Lá fora corre um rio vertical

Vivaldo Simão

Paranoia

Perdi o sono e busquei estrelas
Acordei de um pesadelo e levantei mais cedo
Ouvi gritos,
Tive medo!
Agora já não há segredos:
Tudo se transforma em pesadelos
Psicopatas ambulantes em desespero
Parasitas e ignorantes à procura de travesseiro
Em sonhos lúcidos eu vejo o passado e esqueço o futuro
E progressivamente vou perdendo o medo
Caminhos cruzados, amores afugentados
Um grito não é mais desepero


Agora tudo vira desejo
Um desejo louco de ser
Um ensejo de amor na madrugada
O desejo louco se se perder entre as rosas
e encontrar logo o fim dessas estrada.

* dedicado a Lucilio e seu universo interior

Edilberto Vilanova

quarta-feira, 14 de maio de 2008

Versos para uma canção de amor

Se dentro das horas perdidas na escuridão da noite
A velocidade do raio derrubar as flores do teu jardim
E como um açoite, eletrificar o fio que guarda tuas roupas
Sou eu
Pra dizer que as estrelas caíram sobre mim
Sou eu
Pra dizer que a lua e seu cavalo chegaram ao fim
Ao fim de tudo
Ao fim do universo
E no futuro só restará um pano negro
E um céu rasgado em verso
Postas sobre a mesa: as velhas flores que tu me deste
Papeis rasgados, poemas, garrafas
E cigarros
E no futuro: o vácuo, a solidão, mais nada
Os corpos se dividiram e só encontraram o fim da estrada
Já é madrugada
Por isso, meu amor
Só pra me ver sorrir
Diz que ainda pouco tu pensavas em mim
Por isso, meu amor
Antes do fim
Só pra me ver sorrir
Diga que ainda pouco
Tu pensavas em mim

Edilberto Vilanova

Selos

Concedo demasiado amor nos meus defeitos
Antes que eu suspenda a alma
Terei um mundo sem jeito
Contragulo beijos com bocas passadas
Depois de tanto se amar eu não sinto saudades de mim
Passei o muro para o lado de fora
Fiquei dentro do mundo perfeito
Não corrí com medo dos olhos da sombra
Apenas me neguei ao sentimento claro
Comprimido nos lençois da alma
Não tiraram de mim, ainda, o lacre
Preciso morrer
Eu quero perder o selo.

Arlam Marques

quinta-feira, 17 de abril de 2008

Liquidificador

Agora vejo, meu amor, que nosso amor
Passou
Como um triturador de flor
A flor da pele, de tão flor, degredou
E vôou leve : isopor
Agora vejo, meu amor, que o segredo da maçã
Ganhou a acidez do beijo
E os aneis que revelavam a paz do nosso mundo
Se perderam dos dedos
E para as chaves da dor não há chaveiros
Agora eu te imploro em segredo:
Por favor, meu bem
Guarde meus sapatos e compre novos brinquedos
Deixa a flor do teu seio secar em outra mão
Deixa o mel dos teus olhos escorrer por outros olhos
e quando ele disser que te ama
Desfolhe o teu corpo em outra boca
Enquanto isso eu ficarei
A brincar de ser lobisomem
E me assutarei com outros homens
E quando a noite for pouca tú ouvirás um grito
Abafado, alcoolizado e rouco
E sentirás o sangue do prazer escorrer entre tuas pernas
E quando a noite for longa
Haverá a velha flor que tu me deste
Já seca mas ainda umida
Haverá vinho sobre a mesa
E para contemplar teu desamor
Haverá um fio de voz oca
Um corpo vazio,
um espaço vago,
Um riso irregular,
Algumas batatas podres,
Abacaxis e cebolas
E enfim, para liquidificar a dor,
Um liquidificador.

Edilberto Vilanova

Eu não existo sem você

Eu sei e você sabe, já que a vida quis assim
Que nada nesse mundo levará você de mim
Eu sei e você sabe que a distância não existe
Que todo grande amor
Só é bem grande se for triste
Por isso, meu amor
Não tenha medo de sofrer
Que todos os caminhos me encaminham pra você

Assim como o oceano
Só é belo com luar
Assim como a canção
Só tem razão se se cantar
Assim como uma nuvem
Só acontece se chover
Assim como o poeta
Só é grande se sofrer
Assim como viver
Sem ter amor não é viver
Não há você sem mim
E eu não existo sem você
Tom Jobim


Postado por Hérika

terça-feira, 1 de abril de 2008

Quatro Estações




Flores de maio,

sol de verão

A primavera está chegando

É o fim da solidão

O pardal encontrou casa

E a andorinha ninho para si

E eu os teus altares



Nuvens e raios sobre o sertão

Avisa lá que está chovendo

É o fim da sequidão

Diz ainda que a gente

Conseguiu sobreviver à dor

E Deus mandou a chuva



Primavera e verão no outono

Ou inverno, então

O Senhor é o meu Pastor


Na alegria e na dor

Eu confio em Ti, Senhor

Nada vai me separar do teu amor
Kleber Lucas
Postado por Hérika

domingo, 23 de março de 2008

Samba de amar errado

Ah!esse caoticoração não sabe o que quer
Renegando o altar que essa mulher
Dispõe ao meu amor
Que o amor de outra mulher
Não quis provar
Fez pouco caso
Olhou de lado
E eu de tão acostumado
Ao fado de amar errado
De a-mar-es amargos dantes navegados
Encarei a tempestade sem saber
Que dessa vez era mais sério
Qual misterio esse: gostar do avesso do amor, a indiferença
E essa outra que me tem tanto zelo
Se despedaça inteira em apelo
Sobre meu peito: puro gelo pra esse amor
Que estimarei quando não mais tê-lo
For um erro consumado enfim

Vivaldo Simão

sexta-feira, 7 de março de 2008

CARTA PRA O CARNAVAL

Todo ano é a mesma coisa: você chega, fica aqui três dias e aí vai embora.
Volta um ano depois, todo animadinho, querendo me levar para a gandaia.
Olha, honestamene, cansei.

Seus amigos, bando de mascarados, defendem você.
Dizem que sempre foi assim, festeiro, brincalhão, mas que no fundo é supertradicional, e de raízes cristãs, e só quer tornar as pessoas mais felizes.

Para mim? Carnaval, desengano...você recorre à sua origem popular e incentiva
essas fantasias nas pessoas, de que você é o máximo, é pura alegria, mas não passa de entrudo mal-intencionado, um folguedo, que nunca viu um dia de trabalho na vida.

Acha-se a coisa mais linda do mundo e é cafonice pura. Vive desfilando pelas ruas, junto com os bêbados, relembrando o passado. Chega a ser triste.
Carnaval, você tem um chefe gordo e bobalhão que se acha um rei, mas não manda em nada. Nunca teve um relacionamento duradouro. Basta chegar perto de você e temos que agüentar aquelas fotos de mulheres nuas, que são o seu grande orgulho. Você não tem vergonha, não?

Sei que as pessoas adoram você, Carnaval, mas eu estou cansada dos seus excessos e dessa sua existência improdutiva. Seja menos repetitivo, proponha algo novo. Desde que o conheço, você gosta das mesmas músicas. Gosta de baile. Desculpa, mas estou pulando fora.

Será que essa sua alegria toda não é para esconder alguma profunda tristeza? Será que você canta para não chorar? Tentei, várias vezes, abordar essas questões, e você sempre mudou de assunto.

Ora, chega dessa loucura. Reconheça que você se esconde atrás de uma dupla personalidade.
Cada vez mais e mais pessoas ficam incomodadas com essa sua falsa euforia, fique sabendo.
Conheço várias que fogem, querendo distância das suas brincadeiras.
Você oprime todo mundo com esse seu deslumbramento excessivo diante das coisas, sabia?
Por exemplo, essa sua mania de camarote. Onde os vips podem suar sem que isso pareça nojento.
Onde se pode falar torto sem que seja errado. Todos vestidos de uniforme, senão não entram. Todos doidos para passar a mão na bunda um do outro.
Essa é a sua idéia de curtir a vida?

Menos purpurina, Carnaval. Menos bundas, menos dentes para fora. A vida é linda, mas a " lindeza do lindo mais lindo que há no lindíssimo" é um saco.
Um pouco de calma e autocrítica nunca fez mal a ninguém.
Tudo muda no mundo - por que você insiste em continuar o mesmo?

A harmonia vem da evolução, não das alegorias.
Chegou a hora de rodar a baiana para não atravessar na avenida.

Como será amanhã? Respona quem puder.
Beijos.


Fernanda Young



Postado por Hérika

QUANDO SE ESTÁ SÓ

Quando se está só
O silêncio é mais profundo
As noites são mais longas,
O frio mais intenso
E até a própria sombra
Parece estar mais junta
Como se soubesse
Quando se está só.

Quando se está só
Um grito é desespero,
Sussurro é loucura, um estalo mete medo
E a mão forte aparece e está sempre nos sonhos
Eternos pesadelos, quando se está só

Quando se está só, se está porque deseja
Pois Ele, com certeza, não foge de ninguém
Deus está sempre perto; amigo, braço aberto
Convida a ir com Ele pra não mais se estar só



Jorge Camargo



Postado por Hérika

ABISMO DE GERAÇÕES

Eu tenho a leve impressão
De que as coisas têm mesmo é que melhorar
Porque do jeito que estão
Não suporto, não podem continuar

Quando ele é "sim", eu sou "não"
Se ele é "certeza", eu "sei lá"
E entre nós se abrindo o abismo vai
Das gerações

Já não consigo entender
O seu jeito esquisito de conversar
"Eu tô legal, pode crer
Dá um tempo que a vida 'inda vai rolar"

Sou Fluminense, ele é "Flá"
Se eu sou conversa, ele é "plá"
E entre nós se abrindo o abismo vai
Das gerações...

Por isso Deus tem que ser pra nós
Ponto de encontro uma mesma voz
Que nos converte um ao outro e nos traz a paz
Por isso Deus tem que ser pra nós
Ponto de encontro uma mesma voz
Que nos converte um ao outro e nos traz a paz
Abismos nunca mais




João Alexandre




Postado por Hérika

É PROIBIDO PENSAR










Procuro alguém pra resolver meu problema
Pois não consigo me encaixar nesse esquema
São sempre variações do mesmo tema
Meras repetições

A extravagância vem de todos os lados
E faz chover profetas apaixonados
Morrendo em pé rompendo a fé dos cansados
Com suas canções

Estar de bem com vida é muito mais que renascer
Deus já me deu sua palavra
E é por ela que ainda guio o meu viver

Reconstruindo o que Jesus derrubou
Re-costurando o véu que a cruz já rasgou
Ressuscitando a lei pisando na graça
Negociando com Deus

No show da fé milagre é tão natural
Que até pregar com a mesma voz é normal
Nesse evangeliquez universal
Se apossando do céus

Estão distantes do trono,caçadores de deus
Ao som de um shofar
E mais um ídolo importado dita as regras
Pra nos escravizar.

É proibido pensar

Procuro alguém pra resolver meu problema
Pois não consigo me encaixar nesse esquema
São sempre variações do mesmo tema
Meras repetições

Meras repetições
É proibido pensar


João Alexandre


Acompanhe a entrevista sobre a letra da música "É proibido pensar"

http://www.mensagemonline.org.br/joao

Postado por Hérika

segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

Poemelodia

Dizem que a poesia é a mãe das artes
E que a música é a mais completa das artes,
Dizei-me então: qual a mais bela das artes?
Se há poesia na música
E música na poesia